sexta-feira, 2 de julho de 2010

Deixa-me ouvir o que não ouço...



Deixa-me ouvir o que não ouço...

Não é a brisa ou o arvoredo;

É outra coisa intercalada...


É qualquer coisa que não posso

Ouvir senão em segredo,

E que talvez não seja nada...


Deixa-me ouvir... Não fales alto !

Um momento !... Depois o amor,

Se quiseres... Agora cala !


Tênue, longínquo sobressalto

Que substitui a dor,

Que inquieta e embala...


O quê? Só a brisa entre a folhagem?

Talvez... Só um canto pressentido?

Não sei, mas custa amar depois...

Sim, torna a mim, e a paisagem

E a verdadeira brisa, ruído...

Vejo-me, somos dois...

(Fernando Pessoa)

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